terça-feira, 1 de dezembro de 2009

VOCÊ CONHECE A PF POR DENTRO ?

 Abusos
PAD Temerário
A sociedade brasileira vem se acostumando à idéia de viver em um país democrático. Como o aprendizado infantil, o aprendizado democrático nem sempre segue uma constante ascendência, demonstrando por vezes sinais claros de regressão. Estamos na normalidade do processo de amadurecimento e começamos a ver nitidamente, numa fase de autocrítica necessária, que as instituições que formam o Estado Brasileiro "não foram sequer tocadas pelo processo de democratização" 1.

É assim com o Departamento de Polícia Federal. Embora nos últimos anos o resultado dos trabalhos do órgão tenha contribuído para o norte a ser trilhado por nós, no caminho para uma sociedade justa e fraterna2, por inúmeras vezes, esta mesma instituição tem cometido erros imperdoáveis, aproximando-se de polícias autoritárias e nos fazendo lembrar de regimes e épocas sombrias.


A análise da gênese de algumas ações institucionais de desrespeito a direitos constitucionais garantistas, que a despeito do fortalecimento de algumas instituições de viés democrático (Ministério Público, imprensa, Defensorias Públicas, Judiciário, Ouvidorias das Polícias) têm nos últimos anos se concretizado sem grandes obstáculos, e.g. Operação Satiagraha, deve ser feita olhando-se inicialmente para o interior da própria entidade policial.


Nesta análise que antecede as ações policiais que chegam através da mídia ao conhecimento do grande público, é preciso ver como agem os atores e detentores do poder no Departamento de Polícia Federal, para percebermos que motor de abusos externos é cotidianamente sedimentado na rotina institucional interna.


Como atuam os protagonistas do poder dentro da Polícia Federal?


O dia-a-dia da instituição, rotina de exercício do império dos delegados de Polícia Federal, é marcado pelo desestímulo profissional e resignação dos outros agentes de segurança pública (escrivães, agentes, papiloscopistas e peritos criminais federais, ou simplesmente "não-delegados") e servidores administrativos. A maioria é guiada com norte muitas vezes distante da prestação eficiente da segurança pública, sem possibilidades estruturais de mudança.


A finalidade pública deve nortear toda manifestação estatal, é certo, que não pode ser entregue à defesa simples de uma casta, exercício simplório de força ou ao corporativismo gratuito de alguns.


Os delegados assim têm feito e mantido o poder na corporação através de alguns mecanismos eficientes:


1) aposta e incentivo no modelo arcaico do inquérito policial e da divisão segregacionista da carreira policial3;


2) freqüente distribuição, sem critério justo e racional, entre seus pares (e colegas passivos e/ou coniventes) de pequenos "prêmios profissionais": concorridos cursos de capacitação no estrangeiro, viagens para localidades privilegiadas para missões desejadas, lotações estratégicas na estrutura do órgão, remoções ex officio com concessões de ajuda de custo etc;


3) ausência de normatização interna dos direitos e prerrogativas funcionais, em complementação à legislação vigente, com redução conseqüente da amplitude de direitos no cenário interno, deixando a concessão de prerrogativas do servidor ao alvedrio, humores e favores das chefias; e


4) ameaça (implícita) de instauração temerária de processo administrativo disciplinar em desfavor do servidor insurgente.
Interessa neste texto abordar justamente a arbitrariedade da instauração do processo administrativo disciplinar (PAD) temerário, como forma canhestra de punição do servidor.


Ora, o direito ao processo administrativo prévio à punição disciplinar, previsto nos incisos LIV e LV do art. 5º da Constituição Federal4, é GARANTIA CONSTITUCIONAL, inscrita no Título II da Carta Magna, "Dos Direitos e Garantias Fundamentais".


Com efeito, não pode essa garantia constitucional de existência prévia do PAD à punição do servidor ser transformada, numa leitura maquiavélica, na própria punição antecipada.  O processo disciplinar é meio para se atingir o interesse público e não fim em si mesmo.


Em abordagem sobre "O tempo e as penas processuais (penais)", Aury Lopes Júnior5 faz reflexões que se aplicam perfeitamente ao processo administrativo disciplinar temerário, lembrando-nos que "o caráter punitivo (do processo) está calcado no tempo de submissão ao constrangimento estatal(...)".


Assim, temos que o processo (administrativo disciplinar) em si mesmo pode se tornar uma pena, a partir do instante em que não se assenta em justa causa. Esta verdade se avulta para o servidor de bem, impelido a uma dialética estatal que, em última análise, coloca em xeque sua honestidade e retidão.


Conhecida no direito penal como "La pena de banquillo, expressão consagrada no sistema espanhol, para designar a pena processual que encerra o sentar-se no banco dos réus.", também se aplica no âmbito administrativo, quando o processo administrativo disciplinar perde o status de garantia para, manipulado, ser a própria forma de punição.


A simples instauração do PAD inaugura uma série de efeitos deletérios sobre a vida profissional do processado. Um desses efeitos é possibilidade efetiva de afastamento das funções policiais pelo período em que durar o processo administrativo, nos termos do art. 51 da Lei 4.878/65 e art. 147 da Lei 8.112/90. Neste caso, o receio e a intranqüilidade quanto à possibilidade do afastamento, e conseqüente entrega da arma e da carteira funcional, nascem com a abertura do processo administrativo e percorrem todo o seu trâmite, como a Espada de Dâmocles6 sobre a cabeça do policial.
Outra conseqüência é a limitação pela administração de alguns direitos do processado, em decorrência do processo administrativo, tais como a impossibilidade de remoção enquanto perdurar o processo, prevista no art. 33 da Instrução Normativa 04/2009-DG/DPF.


O rol de gravames continua: impossibilidade de participar de missão que implique em afastamento da sede de sua lotação por mais de 24 horas (Item 74 da IN 04/91); registro negativo nos assentamentos funcionais do servidor; temor da quebra da contagem de tempo para a progressão funcional na carreira (art. 3º, inciso II e parágrafo 6º, do Dec. 2.565/98 c/c art. 9º, inciso II, da Portaria Interministerial n º 23, de 13/07/98), dentre outros.


Acrescente-se, sobretudo, o evidente dano à imagem e honra (subjetiva e objetiva), quando da instauração do PAD temerário, maculada pela publicação em boletim de serviço, do início do processo7, com ampla divulgação entre os profissionais da área, além da rotineira exposição midiática.


Um ato administrativo de tão graves efeitos não pode ser precipitado ou movido por propósitos diversos da finalidade pública. Deve ser, pois, precedido de uma sindicância investigativa isenta e transparente, a apontar os indícios consistentes de infração disciplinar, ou, se ausente a sindicância investigativa, precedido de avaliação consistente da existência de justa causa.


Neste sentido, vale citar a decisão do Tribunal Regional Federal de 1ª Região, na Apelação em Mandado de Segurança nº 1999.39.00.008857-3/PA, de relatoria do desembargador federal Antônio Sávio de Oliveira Chaves: "(...) A instauração de processo administrativo pressupõe a existência de justa causa, consubstanciada ao menos em indício de que tenha o servidor cometido irregularidades no exercício de suas atribuições (...)"


Na mesma linha, a decisão do juiz federal Carlos Augusto Pires Brandão, nos autos do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 1999.01.00.042346-7/RR: (...) A instauração de processo administrativo para satisfação de interesses alheios à Administração Pública constitui desvio de finalidade e justifica a intervenção judicial para recomposição da finalidade e moralidades públicas. (...)


Não pode o administrador se furtar à análise da justa causa para instauração do procedimento disciplinar, com o desejo único e indisfarçável de perseguir o policial ou de puni-lo por não compactuar com caprichos.


O processo administrativo não é forma de impedir a desconcentração de poder, a democratização da corporação ou de impor castigo aos descontentes, e sim de legitimar a punição justa por descumprimento de dever funcional.  Leyla Viga Yurtsever lembra que "no processo administrativo, comparece, de um lado, a Administração, não como Poder, que corresponde ao Estado, mas como gestora do interesse público" 8.


Nas claras e contundentes palavras de José Armando da Costa: "(...) O aspecto mais democrático e importante do devido processo legal é a exigência desse imprescindível requisito de iniciação processual (fumus boni iuris), sem o qual ficaria o servidor público à mercê das trepidações emocionais dos seus superiores hierárquicos, os quais poderiam, assim, infelicitar, importunar e desassossegar os seus subalternos como bem lhe aprouvesse, já que não estariam vinculados a esse pressuposto legal" 9.


No entanto, infortunadamente, tem sido assim no DPF. Para usar a feliz expressão cunhada por Luiz Eduardo Soares, persiste no âmbito do Departamento de Polícia Federal um "perverso relicário de iniqüidades" 10.


Foi assim com o Escrivão de Polícia Federal Diógenes Parente Pacheco Filho, punido com pena de repreensão pela Corregedoria da Polícia Federal, por não ter ido abrir o cartório da Delegacia de Campina Grande/PB, para que o delegado Alexandre Henrique Lobo de Paiva pegasse a arma que havia esquecido.


Também foi assim com a instauração de PAD para apurar a responsabilidade funcional de um agente de Polícia Federal, lotado na Delegacia de Joinville/SC, que se "atreveu" a fazer críticas ao inquérito policial, em entrevista a programa de TV.


Na mesma trilha, o Escrivão de Polícia Federal Alexandre Rios Gurgel Nogueira foi alvo de PAD, instaurado para apurar sua responsabilidade funcional por ter, através de advogada legalmente constituída, pleiteado à justiça direito que a ele assistia, contrariando a vontade da chefia da Delegacia de Santarém e da Superintendência do Pará 11.


Contra os desmandos e despotismos de atávicos poderosos, os colegas têm se amparado com êxito no Poder Judiciário: nos três casos citados, escolhidos entre outros tantos, que infelizmente desenham a feição interna da Polícia Federal, a Justiça tem socorrido com o arquivamento dos procedimentos disciplinares e anulação das punições indevidas.


A advogada Carolina Almeida Sidônio é precisa ao pontuar que "infelizmente alguns poucos servidores do DPF ainda carregam consigo um legado da época da ditadura, tentando impor penalidades em total desconformidade com os princípios instituídos pela CF/88, compelindo os injustiçados a reiteradamente recorrerem à Justiça para salvaguardar seus direitos. De forma arbitrária, incompleta e insubsistente, sem substrato de legalidade, vão cometendo abusos pautados no excesso/abuso de poder." 12


Nestes casos, e porque - como já dito - estamos evoluindo para a democracia, transparece o direito ao servidor perseguido ou injustiçado do pleito judicial ao dano moral em caso de PAD temerário.


Embora tenhamos a salvaguarda do Poder Judiciário constitucionalizando as ações abusivas, outra questão interessante surge do abuso iniciado com o PAD temerário: afinal, quem paga a conta?


Ora, injustiçado o servidor, com título judicial contra a União, somos todos nós (contribuintes) que ao final pagamos a conta dos desmandos. São os cofres públicos que arcam com as indenizações por danos morais causados pelos delegados arbitrários, bem como com os gastos decorrentes da movimentação indevida da máquina pública.


Por falar em abuso, difícil é não ver na conduta da autoridade arbitrária, que instaura o procedimento administrativo leviano, a subsunção típica ao art. 4º da Lei 4.898/65:


"Art. 4º. Constitui também abuso de autoridade:

 h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal;"

Segundo a doutrina, o abuso de autoridade pressupõe três requisitos: ilicitude do ato, prática por funcionário público e falta da motivação que o legitime. Esses três pressupostos estão presentes na instauração temerária do processo administrativo disciplinar.


O ato abusivo e injusto, por se distanciar da finalidade pública com a utilização do próprio aparato estatal, chancela-se logicamente como imoral. Por imoral, há flagrante atentado a um dos princípios constitucionais da administração pública, justamente a moralidade administrativa (art. 37, caput, CF).


Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, citada por Eurico Bitencourt Neto, "a imoralidade exsurgirá do conteúdo do ato, quando este conteúdo contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio e justiça, entre outros valores." 12


De tão nefasto ato arbitrário, conclui-se que não basta a correção do ato pelo Judiciário, sendo corolário do combate à proliferação dos abusos a representação administrativa contra a autoridade insensata, para sanções cabíveis. Bem como para que repare à Administração os prejuízos advindos de seu ato ilegal,  nos exatos termos dos art. 121 e 122 da Lei 8.112/90:

                                                             
"Art. 121 O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições.
Art. 122 A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros.
§ 2º Tratando -se de dano causado a terceiros, responderá o servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva."

                                  


Neste ponto, cabe aos sindicatos prestar assessoria jurídica aos seus filiados, em busca da anulação do ato, promoção da responsabilidade administrativa da autoridade arbitrária e indenização por danos morais ao injustiçado. Também cabe à Advocacia Geral da União a competente ação regressiva.


No mais, em tempos de resistência à democratização em nossa instituição, é válido citar Jorge Mautner, numa estrofe aqui dedicada àqueles que acreditam serem eles próprios o motivo último do órgão:

                       
" Urge dracon
   Ave Caesar
   Magnificus, supremus, augustus
  Divinus, superbus, vitalicius
  Professor, dictator, imperator"14.

                                  
  
*Johnny Wilson Batista Guimarães, Escrivão de Polícia Federal, é Delegado Sindical do SINPEF MG em Varginha, bacharel em Direito pela UFMG e pós-graduando em Ciências Penais pelo Instituto Luiz Flávio Gomes.
  
Fonte: Agência Fenapef –http://www.fenapef.org.br/



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quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A Polícia Federal no contexto da segurança pública brasileira


A segurança pública no Brasil, tema muito em voga nos meios de comunicação, nas rodas de amigos, nos debates políticos, e em todas as camadas sociais, é estabelecida e prevista pela Constituição Federal.

A representatividade classista dos policiais federais, através de sua entidade maior, a Federação Nacional dos Policiais Federais, sempre demonstrou em suas iniciativas buscar um caminho, dentro do ordenamento jurídico pátrio, para a real estruturação para Polícia Federal e sua carreira, onde se desenvolva uma atividade policial de vanguarda no nosso País.

Estabelece a Carta Política do Brasil que segurança pública é "dever do Estado, direito e responsabilidade de todos" (Art. 144, caput, CF88), e será exercido pelos órgãos descritos nos incisos seguintes do mesmo artigo legal.

Para as polícias civis, órgão que tem servidores policiais estaduais regidos pelo estatuto civil no âmbito estadual, determina a Constituição, ser "dirigida por delegado de polícia carreira", ou seja, oriundos da carreira policial. Impedindo que essa direção seja exercida por delegados de polícia que não fossem da carreira policial, e que podem ser alçados ao cargo de delegado de polícia, em função gratificada de livre nomeação e exoneração, os chamados vulgarmente "delegados calças-curtas".

Estabelece ainda, que estes órgãos são subordinados aos governadores dos Estados, Distrito Federal e Territórios, e que se incubem, tão somente e unicamente, exercer uma das funções da polícia de segurança, que é o exercício da função de "polícia judiciária", por meio do qual tem a finalidade da "apuração de infrações penais" (§ 4º, art. 144, CF88 c/c Art. 4º, do Decreto-Lei Nº. 3.689/41).

A "apuração de infrações penais" é competência da "autoridade policial" dentro de sua "circunscrição" e não excluirá a mesma a competência da autoridade administrativa a "quem por lei seja cometida a mesma função" (parágrafo único do Art. 4º, CPP). 

Já para as polícias militares, órgão que tem servidores policiais estaduais regidos por estatuto de natureza militar, também subordinada aos governadores dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, a Constituição reservou o papel da outra função de polícia de segurança, a função de "polícia ostensiva" e a preservação da ordem pública (§ 5º, art. 144, CF88), ou seja, as funções de polícia administrativa, preventiva, de prevenção.

Neste mesmo diapasão, o legislador constituinte estabeleceu para as polícias rodoviária e ferroviária federais, ambas com servidores policiais regidos por estatuto civil, o Regime Jurídico Único (RJU), as funções de polícia administrativa destinada "ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais e das ferrovias federais" (§§ 2º e 3º, do art. 144, CF/88), respectivamente. Ou seja, apenas e unicamente a função preventiva de polícia administrativa, de patrulhamento de rodovias federais e ferrovias federais.

Em relação à Polícia Federal brasileira, órgão estruturado em uma única carreira de servidores policiais federais civis, portanto regidos pelo RJU, a Constituição Federal, especificamente, estabeleceu e detalhou sua destinação nos incisos de I a IV, do § 1º, do art. 144 daquele diploma maior.

O legislador constituinte originário estabeleceu para a Polícia Federal uma característica individualizada de polícia para o Brasil, adotando uma lógica diferente à do âmbito estadual, quando constituiu a Polícia Civil (com única função de polícia judiciária) e a Polícia Militar (com função única de polícia administrativa), uma para cada função da polícia de segurança, optando no âmbito federal por reunir as duas funções de polícia de segurança no mesmo órgão. Ou seja, adotou o ciclo completo de polícia no âmbito federal. Em outras palavras, fechou em um só órgão o ciclo das funções da polícia de segurança.
Excetuou, na esfera federal, o patrulhamento ostensivo de rodovias e ferrovias federais, remetendo estas funções de polícia administrativa a órgãos específicos (§§ 2º e 3º, art. 144, CF88).

Percebamos que, dentre as atribuições da Polícia Federal, há elementos diferenciados de todos os demais órgãos relacionados no caput do Art. 144, da Carta.

Mesclando-se no mesmo órgão as duas funções de polícia de segurança, ora com "função de polícia judiciária da União", com a finalidade da "apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei" (incisos I e IV, § 1º, art. 144, CF 88 c/c Art. 4º, do Decreto-Lei Nº. 3.689/41), grifamos, ora como polícia administrativa na prevenção do "tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho", e no exercício das "funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras" (incisos II e III, art. 144, da CF88).

Ou seja, em funções de policiamento de prevenção nas áreas e matérias de suas competências, estabeleceu que a Polícia Federal tem o dever constitucional de se estruturar, diferente de todas as demais polícias brasileiras, para exercer na plenitude suas atribuições de polícia administrativa na prevenção e repressão ao tráfico ilícito de drogas e ao contrabando e descaminho, bem como ao policiamento de fronteiras, marítimo e aeroportuário.

Note-se que tal característica não é uma novidade. A própria Constituição Federal de 1967, alterada pela EC nº. 01/67, em seu art. 8º, inciso VIII, alíneas "a", "b" e "c", previa a organização e manutenção pela União da Polícia Federal. Saliente-se que era o único órgão policial previsto na Constituição anterior, dispondo sobre a finalidade da mesma de exercer as duas funções de polícia de segurança, ora como polícia administrativa de prevenção, no policiamento marítimo, aéreo e de fronteiras e de prevenção ao tráfico de entorpecentes e drogas afins, ora como polícia judiciária com a finalidade de apurar infrações penais.
 
A partir destas ligeiras impressões constitucionais, do sentimento de abandono, da negação sistemática de representantes de um dos cargos da carreira policial federal, que dominou e se intitulou "dirigente" da Polícia Federal, e que é representada pelos ocupantes do cargo de delegado de Polícia Federal (que na sua origem eram inspetores de polícia, denominação mais apropriada para o modelo de Polícia Federal escolhido pelo constituinte originário de outrora e atual) em não tratar a PF como polícia que tem funções de polícia administrativa e judiciária ao mesmo tempo, é que os ocupantes dos demais cargos começaram a ter em mente uma estruturação da Polícia Federal nos moldes previsto na Constituição.

Entendamos, ainda, que essa interpretação deturpada que a Polícia Federal é apenas a polícia judiciária da União e, que nesse sentido, é correlata às polícias civis e que "as duas corporações compartilham da mesma origem", como afirma a Associação de Delegados de Polícia Federal, em matéria em seu site oficial (clique aqui para ler a matéria), é puro "jogo de cena" querendo reforçar a idéia e a percepção de que a Polícia Federal é um "espelho" da Polícia Civil do Distrito Federal, de âmbito Federal.

Essa falsa assertiva, além de equivocada, denota a total, peremptória e contumaz prevaricação de todos os dirigentes da Polícia Federal, em não estabelecer uma decisiva estruturação da Polícia Federal, com segmentos de polícia administrativa, para o policiamento preventivo de fronteiras, aeroportuário e marítimo, bem com a finalidade de prevenir crimes de sua competência. E também reforçar uma idéia corporativista, na pior acepção da palavra, de se criar uma hipotética carreira jurídica, com respaldo no viés jurídico do modelo da investigação brasileira através do inquérito policial.

No entanto, mister é entender o real significado da atividade policial genericamente e da atividade policial federal especificamente, e qual o seu papel e onde estamos (PF) inseridos nesse contexto.
 
Infelizmente, nos foi passado (por interesse próprio da categoria dominante) ao longo de décadas que somos uma polícia "judiciária", tão-somente e, por muito tempo, absorvemos essa idéia. Que somos uma espécie de "polícia civil" da União, como é a do Distrito Federal.
 
Essa noção, graças a Deus, já começa a desmoronar exatamente quando definimos que queremos a "extinção do IPL". Coisa que há pouco tempo era impossível de se imaginar e tínhamos resistência até mesmo entre agentes e escrivães (não que ainda não temos), mas hoje já percebemos que a "juridicidade" dada à investigação no Brasil não pode persistir, sendo até mesma colidente com o principio constitucional do contraditório na persecução criminal, isto posto em recentes julgados e orientações do STF e CNJ no direcionamento das garantias constitucionais.
 
Mais ainda: reforça essa noção de que não somos apenas uma "polícia judiciária", como o é as polícias civis, quando o espaço deixado por nós nas atribuições inerentes às atividades da Polícia Federal de polícia administrativa, são retratadas nas "operações" policiais inadequadas e apoderadas pela Polícia Rodoviária Federal (que tem função originária no policiamento de trânsito das rodovias federais). Começamos a ter noção de "ciclo completo de polícia", recentemente vindo à baila durante a 1ª Conseg – Conferência Nacional de Segurança Pública, realizada de 27 a 31 de agosto do corrente ano.

Quanto ao modelo que buscamos e que gera desencontros no nosso meio de policiais não-delegados, existe tão somente por sermos ignorantes (no sentido de ignoramos mesmo, por desconhecimento da matéria) e não estudarmos a fundo modelos de polícia e de persecuções criminais e quais os avanços e sistemas modernos existentes.

Essa assertiva é tão patente que, antes da 1ª Conseg, pouquíssimos policiais conheciam ou tinham ouvido a expressão "ciclo completo de polícia". Nem mesmo os indigitados gestores da Polícia Federal. Entender o significado da expressão, impossível!

Fato inusitado até, e que demonstra a propalada ignorância nossa, especialmente dos ditos "dirigentes" de última hora e juristas de qualquer hora, quando o assunto é a ciência policial, por ser o tema parte do primeiro programa de governo do então candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva. E, mais ainda, por ter sido uma das diretrizes mais votadas na referida Conferência: "estruturar os órgãos policiais federais e estaduais para que atuem em ciclo completo de polícia". Enquanto já era do conhecimento de cientistas sociais e estudiosos do assunto, era totalmente desconhecido dos "doutores" da polícia federal.
 
No debate do modelo que deve ser estruturada a Polícia Federal, devemos ter em mente a atividade da ação policial como um todo. Em sua plenitude. Tanto na área de policiamento preventivo/ostensivo como de investigação prévia, que é apenas uma pesquisa da ocorrência acontecida ou um levantamento antecipado da incidência criminal, apurando-se fatos ocorridos, suspeitos de práticas delituosas e utilização da inteligência (informação) policial para prevenção e repressão do crime prestes a acontecer ou ocorrido. E a formalização da culpa, que é o viés jurídico da investigação que hoje no Brasil está inserida no inquérito policial, como ainda é previsto na legislação processual penal e infraconstitucional.
 
No entanto, entendemos que qualquer iniciativa de acusar formalmente o suspeito, por meio de procedimento pré-processual (inquérito) ou processual (instrução criminal), deveria ser efetuada pelo Ministério Público ou pela justiça criminal.

Investigação policial é diferente de qualquer ato que formalize a culpa, como indiciamento, nota de culpa, compromisso formal de testemunhas sob as penas da lei, oitivas, inquirição, qualificação e interrogatório etc, que são atos próprios de formalização jurídica da investigação e devem ser presididos fora do ambiente policial. Com direito ao contraditório e garantias constitucionais.
 
Todo esse aspecto é maior quando se trata da Polícia Federal, já que constitucionalmente não detém – apenas - a função de "polícia judiciária".
 
Por isso, a participação da área jurídica nestes debates, envolvendo o Ministério Público (MP) e o Judiciário, que são destinatários do resultado direto do trabalho policial.
 
O juizado de instrução, por exemplo, já está em franco desuso. A tendência moderna é o MP absorver a fase pré-processual (inquérito criminal, e não a investigação propriamente dita) sob a observância de um "juiz de garantias".
 
Devíamos todos estudar o resultado da pesquisa acadêmica encomendada pela FENAPEF à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É tarefa obrigatória mínima para todo o sindicalista da Polícia Federal e um "dever de casa" para todo policial federal.
 
A Comissão de Reforma do CPP do Senado, da qual estamos alijados da discussão, caminha nessa direção. Mais por desenvolvimento natural e evolutivo do processo penal brasileiro, do que por vontade própria dos delegados de polícia lá representados. No entanto, eles, delegados, buscam abrir passagem e brechas para mais prerrogativas exclusivas de seu cargo nessa nova concepção. O que é um contra-senso, já que se entendem "juristas" da esfera policial.
 
Em relação à "reestruturação da carreira policial federal" (prefiro entender que seria a "estruturação" já que nunca foi de fato estruturada, no máximo, foi mal organizada), temos que marchar no sentido de estruturá-la, visando adequá-la ao enfoque próprio do legislador constituinte originário. Vale repetir: em que se considere a Polícia Federal na sua plenitude constitucional de polícia administrativa e de investigação, ou seja, de ciclo completo de polícia, assunto tão desconhecido para nosso público quanto mal interpretado, mormente por aqueles que entendem que somos apenas uma polícia "judiciária" e defendem que o "produto final" do nosso trabalho seja o inquérito policial.

Percebamos, ainda, que em qualquer tentativa de estruturação da carreira policial federal, por ser sui generis no Brasil, tem que ser totalmente diferente das carreiras das outras polícias, seja de âmbito federal ou estadual. Ou seja, tem de ser uma estrutura diferente, por exemplo, da Polícia Rodoviária Federal e diferente da Polícia Civil do DF.
 
Resta-nos compreender esse aspecto e característica da nossa Polícia Federal, que não interessa aos delegados da PF (porque lhes tirará poder e importância de seus cargos, porquanto desenvolverá a outra função de polícia administrativa) e que sempre foi uma atividade – a de polícia administrativa – relegada por eles e que agora, percebendo o argumento existente, buscam (quando não minimizá-la) inseri-la como "prerrogativa" deles chefiar uma tropa de federais operacionais e tecnicamente policiais. Assunto tão adverso das ciências jurídicas como o é o viés jurídico da investigação policial, representado pelo modelo adotado no Brasil através do inquérito policial, da ciência policial.

Diante dessa realidade, que desde muito tempo, até mesmo no mandamento constitucional anterior era uma característica nossa, devemos discutir essa faceta e análise de forma textual e levar ao conhecimento político e governamental (ao governo particularmente interessa essa ponto de vista de ciclo completo polícia adotado na Constituição Federal de 1988, em relação à Polícia Federal) para programarmos uma política sindical visando uma profunda transformação no modelo de polícia brasileiro, a começar por nós.
 
Esqueçamos Polícia Civil, PRF, peritos e delegados...
 
Partamos pra cima com uma nova postura e com fundamento na própria Constituição brasileira. E exijamos uma estruturação dos cargos de agente, escrivão e papiloscopista unificados num cargo policial, por meio de uma lei orgânica condizente com as competências constitucionais da Polícia Federal, na esfera de polícia administrativa com novo paradigma de policiamento federal e de investigação prévia, onde fomos forjados.
 
Nesse aspecto, devemos construir uma carreira sólida, com atribuições novas de direção e fora da esfera "jurídica" da investigação, já que a Constituição Federal/88,faz alusão apenas às polícias civis, que serão "dirigidas" por delegado de polícia, não sendo referência para as polícias Rodoviária Federal e Federal. E faz sentido, já que aquela exerce função unicamente de policia judiciária, enquanto estas exercem função de polícia administrativa no patrulhamento das rodovias; e de polícia administrativa preventiva e judiciária da União, respectivamente.

Um cargo único resultante dos três cargos policiais operacionais, com perspectivas de crescimento e que se desenvolva desde o patrulhamento ostensivo até a área de investigação prévia, de inteligência e de direção (gerenciamento/gestão) dessa atividade dentro da Polícia Federal, deve ser considerado como um avanço para uma nova política de segurança, inclusive prenunciada na 1ª Conseg, como já dito.
 
Entendemos salutar que um novo Conapef – Congresso Nacional dos Policiais Federais venha ao encontro de nova percepção da atribuição, competência e da vocação originária da Polícia Federal, como uma polícia de vanguarda voltada para a prevenção e repressão ao crime fronteiriço, ao contrabando e descaminho, ao crime de tráfico de drogas, ao policiamento marítimo e aeroportuário, etc.

Atribuições relegadas por aqueles que entendem pertencer a uma hipotética carreira jurídica dentro da carreira policial, em detrimento de um melhor serviço prestado à sociedade brasileira, e usurpada diariamente por instituições policiais com finalidade constitucional diversa, como as de policiamento de trânsito rodoviário federal, que se aproveitam do vácuo deixado por nós, tem sido um prejuízo inestimável para o erário e para a população brasileira.

O debate é enriquecedor e devemos construí-lo em cima de uma argumentação forte, consistente e lógica, dentro da realidade constitucional do nosso ordenamento jurídico e coerente com os melhores procedimentos e políticas dos sistemas envolvidos, tais como os setores que possam ser nossos aliados e do contribuinte, como o Ministério Público, a magistratura, políticos e governo.

Por fim, creio que devamos nos mobilizar, sim, com um discurso único, da nossa categoria, independente dos setores correlatos das polícias civis e das polícias administrativas, estaduais e federais, assim como um discurso diferente do que defendem delegados e peritos federais.
 
E mais: mostrar aos atuais governantes e eventualmente aos futuros um projeto político para a Polícia Federal  pioneiro, inovador e dentro das atribuições constitucionais da Polícia Federal, pelo bem da democracia, pelo bem do Brasil!
 
Tércio Fagundes Caldas é vice-presidente do SINPEF/PB.


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domingo, 18 de outubro de 2009

A HIERARQUIA NA PF


 Por Flavio Werneck

Caros Policiais Federais;

Estou redigindo este texto com profundo pesar. Posso dizer que o adjetivo que mais se adequa ao momento é: AMARGURA. Cada vez mais sinto que estamos caminhando para uma situação de perda. Perda de respeito, perda de atribuições, de amizade, de convívio saudável, de ambiente de trabalho salutar, de democracia...
Nessa inglória posição de sindicalista, que todos afirmam aos quatro ventos ser benéfica, mas que até hoje me trouxe cabelos brancos e inimizades (até daqueles que reputava "colegas" de trabalho), fico cada vez mais consciente do que a Polícia Federal vai se transformar, se não houver a imediata adoção de uma carreira única justa, que se paute pela competência e capacitação.
Vamos ao estopim dessas poucas e desarticuladas palavras (o que não quer dizer que não contribuiu para encher o barril de pólvora que permeia minha cabeça):
Na minha busca diária por um alento, me deparei no sitio da associação dos delegados de polícia federal com a seguinte matéria: "A hierarquia e os cargos de chefia no DPF - xxxxxx". Com minha curiosidade aguçada, comecei a ler a monografia acima. Eis que me deparo com a redação abaixo (fls. 37/38):

"3.1 A hierarquia funcional
Existe uma diferença tênue entre o uso corriqueiro das palavras profissão e carreira. De dicionário pátrio, destacaram-se definições de interesse a esta pesquisa:

CARREIRA [Do lat. vulg. carraria, i. e., via carraria, 'caminho de carro');.profissão: carreira militar. carreira diplomática. (Ordenação dos postos, em níveis decrescentes, dos funcionários efetivos do Ministério das Relações Exteriores do Brasil); Fazer carreira:. Alcançar boa posição social e/ou profissional. (FERREIRA, 1997, p. 358).
PROFISSÃO [Do lat. professione.]: Atividade ou ocupação especializada, e que supõe determinado preparo: a profissão de engenheiro; a profissão de motorista; Profissão liberal. - Profissão de nível superior caracterizada pela inexistência de qualquer vinculação hierárquica e pelo exercício predominantemente técnico e intelectual de conhecimentos. (FERREIRA, 1997, p. 1398).

PROFISSÃO é uma atividade específica na sociedade, e CARREIRA é o conjunto dos níveis profissionais a serem atingidos por acesso ou promoção ao longo do tempo em determinada atividade. Pode-se, ainda, chamar de profissão a escolha por uma formação, ou seja, uma área para atuação ou a atividade que será exercida. Depois de formado, o profissional passa a trabalhar e colocar em prática o que aprendeu.
À evolução individual do profissional dá-se o nome de carreira. Diz respeito ao sucesso do indivíduo, ou sua colocação na hierarquia de uma empresa. Como exemplo pode citar os Office-boys, que muitas vezes são promovidos e promovidos, galgando cargos mais elevados que em conjunto com seus estudos, o faz tornar-se gerente ou até mesmo diretor.
A CF/88, ao instituir a Polícia Federal, determinou sua estruturação em carreira. Como visto no item 1.2 deste trabalho, a estrutura funcional da Carreira Polícia Federal é simples e composta por cinco cargos públicos de natureza estritamente Policial: Delegado de Polícia, Perito Criminal, Escrivão de Polícia, Agente de Polícia e Papiloscopista Polícia. Cada cargo é dividido em quatro níveis, sendo o nível inicial denominado Terceira Classe, e o final da carreira a Classe Especial.
Uma primeira ordenação em uma hierarquia funcional direta, explicitamente, se encontra estabelecida na carreira: Os cargos de Agentes, Escrivães e Papiloscopistas são inferiores aos cargos dos Delegados e Peritos, portanto, são os ocupantes daqueles cargos diretamente subordinados a estes em qualquer situação.

Decreto-Lei nº 2.320, de 26 de janeiro de 1987
Art. 1° A Carreira Polícia Federal far-se-á nas categorias funcionais de Delegado de Polícia Federal, Perito Criminal Federal, Censor Federal, Escrivão de Polícia Federal, Agente de Polícia Federal e Papiloscopista Polícia Federal, mediante progressão funcional, de conformidade com as normas estabelecidas pelo Poder Executivo.
§ 1° As categorias funcionais de Delegado de Polícia Federal, Perito Criminal e Censor Federal são classificadas como categorias de nível superior.
§ 2° As categorias funcionais de Escrivão de Polícia Federal, Agente de Polícia Federal e Papiloscopista Polícia Federal são classificadas como categorias de nível médio. (BRASIL, 1987).

Não há uma relação hierárquica funcional entre os ocupantes dos cargos de delegados e peritos, estabelecendo-se somente uma subordinação administrativa, com relação ao nível ocupado pelo servidor: um delegado ocupante da 1ª Classe será superior a um perito da 2ª Classe ou, um perito de classe especial será superior ao delegado de 1ª classe.
Ao escolher por profissão a atividade POLICIAL FEDERAL, o candidato, depois de aprovado em regular concurso público e concluir o curso de formação profissional do cargo almejado, sendo nomeado e tomando posse, inicia sua carreira na 3ª classe. Trabalhando e colocando em prática o que aprendeu, sua evolução individual na profissão dar-se-á à medida que passa o tempo. Atingindo os requisitos exigidos (avaliação satisfatória e 5 anos de efetivo exercício), é promovido para as classes seguintes (2ª e 1ª), e será promovido ao topo da carreira (classe especial) após mais cinco anos de efetivo exercício, avaliação satisfatória e aprovação no Curso Superior ou Especial de Polícia. Não havendo percalços durante sua evolução profissional, o servidor, em um prazo mínimo de 15 anos, percorrerá toda carreira prevista para o cargo ocupado:
O ordenamento jurídico que regulamenta a Carreira Policial Federal, explicitamente, ordena de forma cristalina os níveis de cada cargo específico, não deixando margens de dúvidas de qual classe é superior ou inferior ou, de quem estaria subordinado a quem.

Decreto-Lei nº 2.320, de 26 de janeiro de 1987
Art. 2° A hierarquia na Carreira Policial Federal se estabelece primordialmente das classes mais elevadas para as menores... . (BRASIL, 1987).

É da evolução na carreira que se delineia a ordem hierárquica entre as classes de cada cargo, consubstanciando-se esta na subordinação dos cargos inferiores aos superiores: Os ocupantes de terceira classe são subordinados e inferiores aos de 2ª, 1ª e Especial; os de segunda aos de 1ª e Especial e, este último, superior a todas.
Ao recorrer à norma (Portaria nº 523, do Ministro de Estado de Planejamento de 28 de julho de 1989) que atribui a cada cargo da carreira as características específicas de suas atividades, constata-se a inteligência do artigo 5º e seu inciso II da Lei nº 5.645/70. A hierarquização entre as classes se formaliza. Para cada cargo, as classes superiores apresentam atividades específicas mais complexas e com maior grau de dificuldades do que as atividades atribuídas às classes inferiores. (grifo nosso)
(...)"

O texto, que tem por escopo obter o título de pós-graduação na ANP (ou já o obteve), antes de tudo, é precipitado em seu posicionamento. E digo isso, pois é a mínima posição que posso tomar diante de uma redação com condução tendenciosa, que omite inclusive parecer da Advocacia-Geral da União que (é sabido por todos), quando aprovado pelo Presidente da República e publicado, juntamente com o despacho presidencial, adquire caráter normativo e vincula todos os órgãos e entidades da Administração Federal, abaixo transcrito:

"Par. AGU CQ-35/94 - Par. - Parecer ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO - AGU CQ-35 de 30.10.1994

D.O.U.: 16.11.1994

ASSUNTO: Apuração de irregularidades administrativas.

Nº CQ-35, de 30 de outubro de 1994. "De acordo, face as informações. Em 11/10/94." (Processo nº 00830.005043/89) encaminhado ao Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado Chefe da Casa Civil.

PROCESSO: 00830.005043/89
ORIGEM: Secretaria da Administração Federal/PR.
ASSUNTO: Apuração de irregularidades administrativas.

PARECER Nº GQ - 35 - VINCULANTE

A D O T O, para os fins e efeitos dos arts. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, o anexo PARECER Nº AGU/WM-09/94, da lavra do eminente Consultor da União, Doutor WILSON TELES DE MACÊDO.
Brasília, 30 de outubro de 1994.
GERALDO MAGELA DA CRUZ QUINTÃO
Advogado-Geral da União
PARECER N. AGU/WM-09/94 (Anexo ao Parecer GQ - 35)
PROCESSO N. 00830.005043/89
ASSUNTO: Apuração de irregularidades administrativas.


18. A organização administrativa da União e de suas autarquias e fundações públicas, no aspecto funcional, consiste em quadros compreendidos por cargos efetivos, cargos de natureza especial, cargos em comissão e funções de confiança (cfr. os arts. 2ºe 3ºda Lei n. 5.645,de 1970, e 3ºda Lei n. 8.112, de 1990). A responsabilidade pela direção e chefia incumbe aos titulares dos cargos e funções de confiança, em relação aos quais se aglutinam o poder de mando e o dever de promover a apuração de irregularidades, integrando sistema de controle da legalidade dos atos praticados pelos agentes do Estado, sem estabelecer hierarquização entre as categorias de servidores efetivos. O posicionamento hierárquico deflui da organização estrutural e funcional dos órgãos administrativos a que correspondem feixes de atribuições de cargos ou funções providos em confiança, em decorrência da natureza dos seus encargos. Inexiste subordinação funcional entre os ocupantes de cargos efetivos. (grifo nosso)"
 
Importa ressaltar, ainda, o manual de treinamento em processo administrativo disciplinar da CGU:

"4.2.4.3 - Hierarquia Entre Cargos e Aspectos Extralegais da Composição e da Instalação da Comissão.
Segundo entendimento já esposado pela Advocacia-Geral da União, no Parecer-AGU nº GQ-35, vinculante, não há relação de hierarquia entre servidores ocupantes apenas de cargos de provimento efetivo. A interpretação do órgão de assessoramento jurídico é de que, na administração pública federal, o poder hierárquico está associado aos cargos de provimento em comissão ou às funções de confiança, responsáveis pela direção e chefia. Assim, por exemplo, não há subordinação funcional entre um ocupante de cargo efetivo de nível superior e um ocupante de cargo efetivo de nível intermediário, ainda que na mesma carreira, tão somente em função da diferença de nível dos dois cargos, se nenhum dos servidores ocupa cargo em comissão ou função de confiança. Por outro lado, haveria a vinculação hierárquica entre esses dois servidores se um deles, além de deter um cargo efetivo, concomitantemente ocupasse também um cargo em comissão ou função de confiança, de chefia, por exemplo (mesmo, por mera argumentação, se este fosse o servidor ocupante do cargo efetivo de nível intermediário). Da mesma forma, haveria subordinação funcional desses dois servidores ocupantes apenas de cargo efetivo em relação a um terceiro servidor detentor apenas de cargo em comissão, sem cargo efetivo."

Não vou me ater ao uso de sofismas na redação da monografia. Nem tampouco vou apresentar a apresentação de idéias conflitantes. Espere.... só uma pontuação, afinal uma "mísera transcrição não ofenderá nenhuma nação": Para o autor da Monografia "CARREIRA é o conjunto dos níveis profissionais a serem atingidos por acesso ou promoção ao longo do tempo em determinada atividade." e "A CF/88, ao instituir a Polícia Federal, determinou sua estruturação em carreira." Eureka!!! Apresento-lhes (rufar de tambores!!!): a carreira, seja ela adjetivada ou não; única ou solitária. Ou é isso, ou então temos um novo conceito de carreira (em acordo com a monografia apresentada), onde nunca será facultada a possibilidade de atingir, por acesso ou promoção, o ápice da pirâmide?
No que diz respeito à suposta hierarquia dentro do DPF, como diria o jargão de uma personagem de certa rede televisiva: "Prefiro não comentar!" Fico com o Parecer vinculante da AGU, acompanhado do manual da CGU que reputo mais condizentes. Continuo bradando: Não somos militares. Fora ranço do regime de exceção no DPF.
Por fim senhores (as), gostaria de terminar conclamando todos à reflexão do que realmente é benéfico para toda a sociedade brasileira, não só para o meu "poderzinho particular". Vocês querem a manutenção da impunidade galopante do País? Temem o novo? Passou da hora da mudança na segurança pública deste Brasil!! Termino com uma citação/reflexão:

"É melhor atirar-se à luta em busca de dias melhores, mesmo correndo o risco de perder tudo, do que permanecer estático, como os pobres de espírito, que não lutam, mas também não vencem, que não conhecem a dor da derrota, nem a glória de ressurgir dos escombros. Esses pobres de espírito, ao final de sua jornada na Terra não agradecem a Deus por terem vivido, mas desculpam-se perante Ele, por terem apenas passado pela vida;" Bob Marley

Flavio Werneck é diretor jurídico do SINDIPOL/DF
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domingo, 4 de outubro de 2009

Inquérito policial

O instaurador maluco 
Por: Johnny Wilson Batista Guimarães 
 
 
“5... 4... 3... 2...
- Parem! Esperem aí.
Onde é que vocês pensam que vão?
 
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!!”
 
Raul Seixas
 


A atuação da Polícia Federal como polícia investigativa quase sempre se restringe à apuração tardia de crimes através do inquérito policial. Em plena crise de identidade, este vetusto procedimento (nascido em 1871) demonstra, não obstante, trazer impregnada uma força conservadora quase invencível.

Em que pese o despertar da instituição para a necessidade de absorver novidades tecnológicas e profissionais de segurança pública com formação universitária em todos os seus cargos, estes novos ares (de estrutura e pessoal) não conseguem vencer a persistência do antigo modelo de investigação.
 
As sugestões de mudança que brotam da massa crítica de policiais federais têm esbarrado no conservadorismo das corregedorias e na postura retrógrada de alguns delegados. No mais das vezes, têm recebido olhares severos dos que filtram qualquer possibilidade razoável de mudança.

No campo dos inquéritos e enquanto não conquistamos posições firmes e novas que modernizem a segurança pública, somos norteados por um documento normativo defasado, engessante, formalista e que ainda é defendido e citado como passagem bíblica pelos que são a favor do continuísmo ineficaz: a Instrução Normativa nº 11/2001, do Departamento de Polícia Federal.
Sempre que alguma sugestão é aventada para romper caminhos do burocratismo, evoca-se o mantra desta instrução para impedir a modernização dos trâmites.

É assim o coro rotineiro, quase um segundo hino do DPF:

"Contraria Instrução Normativa nº 11/2001!" a assinatura de documentos elaborados pelos escrivães pelos próprios.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" o fim de carimbos inúteis.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" a delegação de atos no inquérito policial.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" a lavratura de termos circunstanciados por escrivães ou agentes.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" a utilização maciça e ágil de e-mails nas comunicações e solicitações.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" a substituição de termos de declarações prolixos e dispendiosos por informações policiais.
 
"Contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!" o cumprimento pelos escrivães, sem despacho, de atos já normatizados.
 
Qualquer inovação "contraria a Instrução Normativa nº 11/2001!"
 
Desta forma, o que se produz é algo que não atende à segurança pública. São geradas toneladas de papéis, sujeitas tragicamente à incineração ou ao picotamento e recheadas de rubricas e determinações protelatórias, com atos exageradamente concentrados nas mãos dos delegados.
 
Não é mais novidade dizer que os índices de arquivamento dos inquéritos policiais são aberrantes se comparados aos poucos que dão azo às ações penais.
 
No entanto, apegados cada vez mais a tal produto caro e ineficiente – o famigerado inquérito policial - nossos gestores continuam insistindo no erro do excesso de formalismo e, pior, no prêmio das estatísticas
 
Se o produto é equivocado é também equivocada a estatística do produto, por óbvio ululante.
 
Estimula-se a figura do "carimbador maluco", aqui substituído pelo "instaurador maluco": aquela autoridade obcecada que, insaciável, ao se deparar com uma notícia de crime – a mais singela e bagatelar, sem filtro, sem critério, sem norte, mas movido por uma inconfessável pressão ou desejo de atingir metas, automaticamente instaura, instaura e instaura!
 
Cito o exemplo da apuração da prática do crime de descaminho. O Supremo Tribunal Federal aplicou o princípio da insignificância ao fundamento de que deveria ser considerado o novo parâmetro de R$ 10 mil – de tributos ilididos - instituído pela Lei 11.033/2004 (HC nº 92438).
 
Tal decisão do STF, em consonância com inúmeras outras de primeira instância, continua sendo ignorada por "instauradores malucos", como se uma decisão da Suprema Corte não tivesse que repercutir. É comum presenciarmos prisões em flagrante por descaminho em quantidade irrisória de tributo sonegado, em flagrante desrespeito a princípios garantistas.
 
Os defensores das operações "enxuga gelo" e das lavraturas mecânicas trazem a lume o princípio da obrigatoriedade como argumento, esquecendo-se de que os princípios da subsidiariedade, fragmentariedade do Direito Penal e da eficiência encontram amparo proeminente em nosso ordenamento constitucional.
 
Esquecem-se também de que, administrando os rumos da Policia Federal, deveriam estimular o debate crítico e imparcial do atual modelo, com a participação de todos os cargos que compõem os quadros da polícia, sem a defesa simplória da manutenção do poder. Certamente, contribuiriam de fato para que a PF atingisse os anseios sociais, revolucionando o atual modo arcaico de fazer polícia.
 
A esta altura, resta a pergunta: "por que continuar assim?" Talvez porque os milhares de inquéritos menores e triviais que tramitam no DPF formem o atalho para atingir os números cobrados pelas metas enganosas.
 
Esconder-se atrás de "inquéritos fáceis de tocar" é atitude que não condiz com a credibilidade e esperanças depositadas na Polícia Federal.
 
Tais como aqueles instaurados para apurar crimes de moeda falsa sem autoria determinável ou elemento subjetivo do dolo, crimes ambientais de questionável atribuição, rádios piratas/comunitárias de baixa freqüência, apropriação indébita de contribuições previdenciárias de bagatela (muitas vezes com débitos discutidos na esfera administrativa ou inscritos no Refis) ou ainda de descaminho/contrabando de valores irrisórios.
 
Há ainda, no mesmo equivocado raciocínio, as instaurações para apurar crimes prescritos ou de atribuição da Polícia Civil.
 
Os números servem para construir o sucesso falaz das metas e o abrigo de tantos que muito trabalham, mas não conseguem ser eficazes.
 
Enquanto isso as investigações dos delitos mais lesivos à sociedade são preteridas e sufocadas pela política do "quanto mais inquérito melhor".
 
Com efeito, a simples instauração do inquérito policial traz necessariamente repetitivos registros manuais e informatizados, atos cartorários, ofícios de comunicações, infindáveis trâmites entre Ministério Público e Justiça, horas de trabalho de servidores de diferentes órgãos. Portanto, torna-se mais dispendiosa que o benefício trazido pela pretensa atuação estatal.
 
Não são poucos os delegados que preferem iniciar o processo de instauração destes IPLs (e aumentar seu score) a solicitar manifestação prévia do Ministério Público quanto à conveniência, necessidade e razoabilidade de tal empreitada.
 
A quem interessa esta estatística? Reformulo a pergunta.
 
Se pensarmos no imediatismo, talvez aos próprios "instauradores malucos", que assim se escondem, se resguardam e esperam a chegada do quinto dia útil, cumprindo à risca a cartilha.
 
Se pensarmos na manutenção do poder, simplesmente, podemos intuir que o incentivo de um mecanismo velho e fracassado é mais uma manifestação não democrática, que aqui se revela na defesa da estrutura superada que garante o poder aos delegados.
 
Se pensarmos em soluções para a segurança pública, dever de todo cidadão, a ninguém interessa tal prática.
 
*Johnny Wilson Batista Guimarães é Delegado Sindical do SINPEF MG em Varginha, bacharel em Direito pela UFMG e pós-graduando em Ciências Penais pelo Instituto Luiz Flávio Gomes.
 
Fonte: Agência Fenapef



sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O fim da santa inquisição

Por Cláudio Avelar

Com satisfação percebo que apesar da demora, a sociedade começa a conhecer mais de perto a intimidade da maior falácia do sistema criminal – o famigerado inquérito policial. Peça meramente informativa, mas que na verdade não informa.
Falta de objetividade com sobra de burocracia, favorecimentos ideológicos, além de infindáveis pedidos de renovações dos prazos que apesar de atendidos, nunca são suficientes para resolução da dúvida investigatória, fazendo apenas com que a persecução criminal fique cada vez mais engessada.
Como pode? Uma peça que veio ao mundo jurídico apenas para servir de informação, mas que na verdade não informa, serve então para quê? -Para intimidar? Não seria possível, pois vivemos em um sistema democrático. – Para manter o poder da polícia nas mãos do Delegado? Não tem lógica, estamos no século XXI. - Apesar de ser dispensável, ainda é mantido em nosso sistema processual penal? – Só pode ser para favorecer alguém, quem sabe a morosidade que só afasta o cidadão da justiça igualitária?
Respostas difíceis, porém óbvias em um regime que não foi feito para funcionar. Onde a lei de Gérson é a única que funciona: - “Gosto de levar vantagem em tudo, certo”? Por que será que escondem os índices catastróficos desse catastrófico e pernicioso modelo de investigação policial?
Pasmem, mas aproximadamente 85% dos inquéritos policiais são arquivados sem indicar autoria e materialidade, ou seja, não mostram o que aconteceu e muito menos quem cometeu o crime. Absurdo para um sistema inquisitorial. Isso mesmo! Os inquéritos seguem o modelo dos Tribunais da Santa Inquisição – aqueles que queimavam mulheres honestas alegando, mesmo sem provas que eram bruxas e esquartejavam sábios e filósofos, apenas por discordarem das tradições da Santa Igreja.
O Inquérito foi trazido de Portugal na época da colônia, para fundamentar as bases investigativas da polícia e devemos lembrar ainda que nosso antigo reino, sabiamente aboliu essa peça de seu sistema há muitos anos. Aliás, a polícia brasileira está copiando o mesmo modelo, já abolido em todo o mundo e que existe somente dessa forma em três países, que não são modelos razoáveis de democracia, muito pelo contrário: Angola, Moçambique e Timor Leste.
Se aquele que trouxe para nossa realidade percebeu que no mundo moderno não cabe mais. Se todos os países do mundo não mais o utilizam, por conta dos atrasos inerentes de sua implementação, podemos fazer uma óbvia pergunta: Por quê não copiamos o exemplo da Inglaterra, Espanha, Estados Unidos, Japão, Israel, Alemanha, França ou qualquer civilização desenvolvida e seguimos um molde criado apenas para manter poder pelo poder e a fim de simplesmente evitar que se modifiquem essa relação protecionista e praticamente feudal.
Lembremos-nos que a polícia na era medieval foi criada para evitar que os pobres e famintos peões se apoderassem do patrimônio dos ricos. Então o Rei nomeava um nobre, ou pelo menos, um servo fiel para um cargo de poder e a ele era permitido o “poder delegado de polícia”. Nessa seqüência de nomeações e para que esse delegado ou xerife, gordo e puxa-saco, tivesse fortes braços operacionais, eram nomeados soldados, homens pobres, porém corajosos e que em troca de algumas moedas, estariam dispostos a matar e morrer pelo seu senhor.
A história atropelou essa relação sistêmica e aqueles peões de ontem, são hoje bacharéis, mestres e doutores, que pensam antes de matar e não se sujeitam a morrer apenas pela fidelidade patriarcal.
Enquanto isso, esses xerifes de ontem, ainda pensam que o tempo não passou e querem obrigar aqueles, que não são mais peões a cumprirem cegamente suas ordens e usando e abusando do poder delegado de polícia e do valor acusador e poderoso do inquérito policial.
Hoje os próprios policiais, mais conscientes do que nunca, iniciam uma campanha pró-sociedade, mostrando que as peripécias dos procedimentos daqueles xerifes estão com os dias contados, pois além dos clamores sociais pela eficiência da investigação, por não mais aceitarem o modelo antigo, buscam a eficiência em detrimento dos favores inquisitoriais.
Lembro-me um triste fato ocorrido anos atrás em São Paulo, quando um casal de descendentes de japoneses, proprietários de uma escola para crianças, foram acusados de pedofilia. A polícia através das investigações dentro do Inquérito policial, concluiu que eram culpados, indiciando-os em vários artigos do código penal. A imprensa por sua vez, com o dever de informar, mostrou ao mundo o que a polícia concluíra.
Com o passar do tempo, ficou provado que tudo não passara de uma fantasia infantil, com um desagradável pedido de desculpas pelo mal entendido, porém a vida daquele casal estava definitivamente marcada pela injustiça da atualíssima Santa Inquisição, transfigurada pelo inquérito policial.
Os policiais federais de Brasília iniciaram a jornada de buscar a demonstração da ineficiência do sistema ainda adotado no Brasil, com a realização de um Seminário Jurídico em parceria com a OAB e Associações dos Magistrados, Promotores de Justiça e Procuradores da República. A organização que foi dos federais se eximiu de palestrar, mas trouxe as falas, juízes, advogados e membros do ministério público, contando com palestrantes de renome que mostraram em verso e prosa, os problemas, porém apontando as soluções.
De forma inédita, esse Seminário resultou em uma carta de intenções, encaminhada a uma série de autoridades, inclusive ao Presidente da República, ministros e todos os parlamentares. Em breve a sociedade poderá contar com um sistema mais moderno. O inquérito pode até ser extinto que não fará falta, mas enquanto isso não acontece, o cidadão contará com mudanças evolutivas e modernizadoras.
O Deputado Federal José Santana do PR mineiro acaba de encaminhar o projeto de Lei 5508/2009, que atende integralmente a sugestão dos federais, que de forma inédita contou com a parceria ao mesmo tempo, dos magistrados, advogados e ministério público. Assim, em breve a sociedade poderá ver implementado, um sistema eficiente, democrático e que impeça que pessoas sejam investigadas indefinidamente, além de evitar que a polícia indicie e promova julgamentos parciais.
As atribuições devem ser muito bem definidas: a polícia investiga e apresenta ao ministério público provas técnicas e objetivas, que oferecerá a denúncia caso esteja convencido da ocorrência do crime. Por fim, o juiz aceitando a denúncia do promotor, promoverá o julgamento, garantindo o real cumprimento do ciclo do direito.

Luís Cláudio da Costa Avelar
É carioca, ingressou na Polícia Federal em 1984 e sua primeira lotação foi em Naviraí/MS, onde permaneceu até 1989. Depois foi para Juiz de Fora/MG, onde esteve até 1993, SR/DF até 1997 e atualmente está lotado na CGPRE no Ed. Sede. Bacharel em Direito e Administração. Com especialização em Direito Público, Avelar sempre atuou na área operacional, principalmente na repressão ao tráfico de entorpecentes. Eleito para Presidência do sindicato em 2004 e reeleito em 2007 para o segundo mandato, fica à frente do Sindipol/DF até 2010.