O candidato do PSDB à Presidência da República vem anunciando a intenção de criar uma polícia de fronteiras e o ministério da Segurança Pública. Façamos um exercício de memória, para analisar os oito anos em que fomos “atucanados” (atucanar: de a + tucano... dar bicadas em...) e para projetar essa polícia a que José Serra e, seguramente, muitos delegados federais aspiram.
A Polícia Federal, com todo prestígio que gozava perante a sociedade brasileira, na era FHC entrou em processo de empobrecimento e chegou à beira da falência.
Diárias eram pagas com atraso de oito meses e policiais custeavam as operações com recursos próprios. Postos de combustíveis não mais abasteciam viaturas, devido ao acúmulo de dívidas. Eram frequentes as ameaças de suspensão dos serviços de energia elétrica, de abastecimento de água e de telefonia, além de ações de despejo, por falta de pagamentos de aluguéis das sedes de algumas unidades.
A malfadada proposta de estado mínimo, por óbvio, desestruturou o aparato governamental de controle. Refiro-me à Polícia Federal porque vivi, como servidor, aquele estado de coisas. Seguramente, instituições como Receita Federal, Previdência Social, Ministério do Trabalho, dentre outras, também foram sucateadas pela política adotada pelo “tucanato”.
Além do desmonte das instituições, a autoestima dos servidores também foi atingida. Durante os mesmos oito anos, a maioria das carreiras de servidores públicos federais não teve qualquer reajustamento salarial, provocando uma verdadeira debandada de milhares de funcionários.
A quem interessava tudo isso? Por óbvio, àqueles que se apropriaram do dinheiro público, formando quadrilhas especializadas e abrindo caminho para suas atividades criminosas. A reação do Estado era quase nula, em decorrência do marasmo que nos foi imposto e que dominava os órgãos públicos.
Como seria essa polícia de fronteiras de Serra? Provavelmente, chefiada por delegados juristas, com efetivo reduzido, prédios precários, escassez de viaturas e equipamentos, remuneração ridícula dos policiais, armas ultrapassadas, formação e treinamento de duvidosa qualidade, pois capacitação exige investimentos elevados.
Seria montada mais uma máquina administrativa, com diretorias, corregedoria, academia, acarretando uma série de custos. E despesa e investimentos são coisas que ele não fará. Com isso, surgiria mais um paquiderme, com a marca da ineficiência e possível foco de corrupção.
Vale relembrar um preocupante indicador, divulgado há poucos dias pela imprensa: na capital paulista, 95% dos crimes ficam impunes. O percentual não deve ser muito diferente no interior do Estado. A culpa é da polícia? Certamente não. É o lamentável resultado das políticas de segurança pública do ex-governador e de seus antecessores - também tucanos - na principal e mais rica unidade da federação.
Não é de hoje que as fronteiras brasileiras estão abandonadas. A PF, que tem atribuição constitucional de exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras, não o faz como deveria. Drogas e armas de alto poder ofensivo vêm sendo despejadas em nosso território.
Tudo isso motiva a sociedade, governadores e autoridades de segurança pública de vários estados a cobrarem ações efetivas da Polícia Federal. Por sua vez, atendendo a interesses corporativos de delegados, a estrutura da PF mantém-se enfronhada e engessada em cartórios, numa tentativa de se consolidar, cada vez mais, como uma polícia exclusivamente judiciária.
O discurso de reduzir a PF a uma máquina de produzir e tocar inquéritos policiais é, sim, projeto da “república dos delegados”. Nesse sentido, não restam dúvidas de que alguns dos atuais mandatários da Polícia Federal estão atuando nos bastidores da montagem do plano de governo de Serra, no que tange à segurança pública.
É tudo que o delegado da PF quer. Uma repartição cartorializada, o status e tratamento dispensado aos membros da Magistratura e do Ministério Público. Ao seu dispor, escrivães, secretários, agentes da autoridade, papéis etc, transformando-nos na “polícia civil da União”.
Fiquemos atentos: o projeto de lei orgânica da Polícia Federal, que tramita no Congresso Nacional, haverá de ser o condutor das soluções para esses problemas.
Nossa proposta é simples: o cumprimento de dispositivos constitucionais. Visa, sobretudo, oferecer propostas e soluções satisfatórias para a prevenção e repressão aos muitos crimes e criminosos que cruzam nossas fronteiras, como o tráfico de drogas, que tem atingido de forma avassaladora as áreas urbanas e rurais de nosso País.
Deixar vingar o projeto de uma Polícia Federal, feito pelos e para os delegados, assim como permitir prosperar essa ideia esdrúxula do candidato Serra, soa como ofensa aos policiais federais e como desrespeito à inteligência da sociedade brasileira.
Marcos Vinício de Souza Wink é presidente da FENAPEF
Fonte: Agência Fenapef
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